Ofício da informação – Orçamento de Estado e o papel dos jornalistas

Os jornalistas são artesãos da palavra e guardiões da informação, essenciais para uma sociedade bem informada. No entanto, em Portugal, a sua importância parece subvalorizada, tanto pelo Estado quanto pela população. O Orçamento do Estado de 2025 (OE2025) tem recebido críticas por negligenciar medidas de apoio ao setor jornalístico, o que intensifica a precariedade de uma profissão crucial. O Sindicato dos Jornalistas (SJ) tem alertado para a ausência de políticas públicas que promovam melhores condições de trabalho e um financiamento sustentável para o jornalismo, questões que impactam diretamente a qualidade da informação acessível ao público.
Um dos pontos de maior preocupação é a falta de um regime fiscal favorável para empresas jornalísticas. O SJ defende, por exemplo, a isenção do IVA em assinaturas de jornais e revistas, uma medida já adotada em países como a Bélgica e o Reino Unido, onde ajudou a fortalecer a imprensa local e independente. Com o jornalismo cada vez mais dependente de modelos digitais de distribuição, um alívio fiscal poderia dar suporte à sustentabilidade financeira do setor, contribuindo para preservar tanto redações quanto postos de trabalho.
Outra omissão importante no OE2025 é o apoio direto ao jornalismo de interesse público, adotado em vários países europeus. Esse apoio seria fundamental para proteger a independência editorial, especialmente das pequenas e médias empresas de comunicação, que enfrentam dificuldades no contexto da crise do setor. Sem este suporte, o jornalismo de investigação e de qualidade, que demanda tempo e recursos, torna-se ainda mais inviável. Isso reduz a pluralidade de vozes e compromete a capacidade do jornalismo de exercer a função de fiscalização dos poderes instituídos, um pilar essencial da democracia.
As condições financeiras dos jornalistas em Portugal são alarmantes: cerca de 30% ganha menos de mil euros por mês, de acordo com o SJ. O OE2025 não oferece soluções para essa realidade, ignorando a possibilidade de criar bolsas de apoio a jornalistas e redações, que poderiam proporcionar maior segurança e dignidade à profissão. Além disso, o governo falha em reconhecer as organizações jornalísticas como instituições de utilidade pública, um passo que traria benefícios fiscais e acesso a apoios institucionais. Este reconhecimento fortaleceria o jornalismo como um serviço essencial para a sociedade democrática.
Outro ponto crítico do OE2025 é a falta de atualização da contribuição audiovisual, que afeta o orçamento da RTP. Com planos de rescisões e uma redução gradual na publicidade, a RTP enfrenta uma pressão financeira crescente, o que limita a sua capacidade de produzir conteúdos de qualidade e cumprir o seu papel informativo e educativo. O enfraquecimento da RTP prejudica o acesso dos cidadãos a uma fonte de informação imparcial e diversificada, especialmente num cenário de concorrência desleal com plataformas internacionais de streaming e crescente desinformação nas redes sociais.
A arte do jornalismo é fundamental para a sociedade, e o OE2025, ao ignorar as necessidades do setor, mostra uma falta de visão para proteger um dos pilares da democracia. Os jornalistas são, em essência, contadores de histórias que informam e inspiram. Sem o reconhecimento e apoio adequados, essa arte corre o risco de desaparecer. Este orçamento poderia ter sido uma oportunidade para fortalecer o jornalismo de interesse público, mitigar a precariedade da classe e garantir a independência editorial, mas ao deixar de lado essas medidas, o governo contribui para o declínio das condições de trabalho e da diversidade informativa. Numa democracia saudável, o jornalismo deve ser tratado não apenas como um serviço, mas como um bem cultural e essencial, que precisa de proteção e incentivo.
Fortalecer o jornalismo em Portugal é um imperativo democrático. Sem um compromisso claro do Estado, arriscamo-nos não só a comprometer a liberdade de informação, mas também a própria essência da arte de contar histórias que moldam e refletem a nossa sociedade. Num mundo onde a verdade é um bem precioso, o jornalismo é a arte que sustenta a liberdade e serve como espelho da sociedade.
Gonçalo Brito