O Fim das Relações Internacionais: O Isolamento dos Estados Unidos

05-03-2025

Numa viragem inesperada e profundamente perturbadora para a ordem mundial, o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, impôs ontem, dia 4 de março, novas tarifas comerciais ao Canadá e ao México, acentuando a trajetória de isolamento norte-americano e assinalando um perigoso retrocesso nas relações internacionais. Este movimento audaz e controverso poderá ser o derradeiro "prego no caixão" da diplomacia multilateral, revelando uma nova era de nacionalismo económico exacerbado e de distanciamento estratégico.

Desde o início do seu mandato, Trump tem adotado uma postura intransigente e unilateralista, enfraquecendo alianças e desmantelando tratados comerciais e ambientais. As recentes tarifas sobre os seus vizinhos norte-americanos surgem na esteira de uma longa lista de ações hostis, desde a retirada do Acordo de Paris até à erosão da NATO, gerando um cenário distópico de desconfiança e fragmentação global. O teórico político John Mearsheimer, conhecido pelo seu realismo ofensivo, já alertava: "Quando os Estados Unidos abandonam o multilateralismo, o mundo torna-se menos previsível e mais perigoso."

A política de tarifas de Trump não visa apenas o Canadá e o México, mas insere-se numa estratégia mais ampla de protecionismo económico. O antigo conselheiro económico de Trump, Peter Navarro, defendeu abertamente uma economia menos dependente do exterior, promovendo o conceito de "America First". Contudo, esta política tem gerado repercussões negativas para os próprios consumidores americanos, que enfrentam o aumento de preços em bens essenciais, afetando desproporcionalmente as camadas mais vulneráveis da sociedade.

A nível internacional, o isolamento dos Estados Unidos tem aberto espaço para o fortalecimento de outras potências, nomeadamente a China. Xi Jinping tem aproveitado o vazio deixado por Washington para reforçar a Iniciativa do Cinturão e Rota, oferecendo alternativas económicas e comerciais a países que antes orbitavam na esfera de influência americana. "O vácuo de poder nunca permanece vazio por muito tempo," como escreveu Henry Kissinger, e a ascensão chinesa é uma prova cabal disso.

A Europa, sentindo o vácuo de liderança deixado pelos Estados Unidos, prepara-se para um esforço hercúleo no sentido de mitigar os danos deste novo paradigma internacional. Líderes europeus reúnem-se, de forma urgente, em Bruxelas, delineando uma estratégia que preserve o comércio livre e o multilateralismo, enquanto reforçam a sua própria autonomia estratégica. O economista Joseph Stiglitz reforça a importância desta posição ao afirmar que "num mundo cada vez mais interdependente, o isolamento é uma receita para o declínio."

Adicionalmente, há um crescente apelo ao fortalecimento das instituições europeias e à construção de uma política de defesa comum, capaz de substituir a tradicional dependência da proteção norte-americana. Este movimento ecoa as ideias de Jürgen Habermas, que há muito defende uma "Europa pós-nacional" onde a solidariedade política se sobrepõe aos interesses individuais dos Estados-membros.

Do ponto de vista social, o isolamento dos Estados Unidos tem gerado uma onda de xenofobia e de políticas anti-imigração que ameaçam a coesão social. O filósofo esloveno Slavoj Žižek já havia alertado que "o medo do outro é um sintoma de sociedades em declínio", uma realidade que se manifesta na polarização crescente da sociedade americana e na proliferação de discursos de ódio.

O mundo encontra-se numa encruzilhada histórica. Se a Europa conseguir unir-se em torno de uma visão de futuro comum, poderá emergir como a nova guardiã da ordem liberal internacional. Se falhar, o isolamento dos Estados Unidos poderá arrastar consigo o mundo inteiro, mergulhando-o numa era de instabilidade e de regressão civilizacional. Como escreveu Zygmunt Bauman, "a fragilidade das redes internacionais é a fragilidade da própria modernidade". A responsabilidade que recai sobre os ombros dos líderes europeus é, portanto, tremenda — e o tempo para agir está a esgotar-se.

Num horizonte mais alargado, esta conjuntura obriga a uma reflexão profunda sobre o futuro da globalização e da cooperação internacional. À medida que o unilateralismo se expande, os valores democráticos e os direitos humanos correm o risco de serem subordinados aos interesses nacionalistas. A única saída viável para evitar este cenário catastrófico reside na promoção de um diálogo internacional inclusivo e no fortalecimento das organizações internacionais, que, como disse Kofi Annan, "Mais do que nunca na história humana, partilhamos um destino comum. Só podemos dominá-lo juntos."

Gonçalo Brito

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